sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Coração mudo

clip_image002ASSUNTO
Esclerose múltipla (esclerose lateral amiotrófica), eutanásia, relações familiares, afetivas e sociais, segredo.
SINOPSE
Três gerações de uma família se encontram na casa da matriarca para um fim de semana. Doente terminal, ela está decidida a acabar com sua vida naquele domingo e, por isso, deseja dar o adeus final a seus entes mais queridos. Sanne e Heidi, suas filhas, já concordaram em acatar a decisão da mãe de partir antes da doença se agravar, mas a proximidade com o fim faz da decisão algo cada vez mais difícil de lidar. Enquanto o fim de semana progride, antigos conflitos voltam a atormentá-los.
IMAGEM
O OLHAR DA PSICOLOGIA
“Coração Mudo” (2014) do dinamarquês Bille August (Marie Krøyer – 2012, Trem Noturno para Lisboa – 2013). O filme explora um tema polêmico, estamos falando de eutanásia. Diferentes aspectos são apontados na trama, envolvendo a decisão de um suicídio com o consentimento de toda a família, a aceitação e sofrimento dos envolvidos, segredos familiares, conflitos antigos e a experiência de viver um luto antecipado. As três gerações da família enfrentam a difícil questão, cada qual com sua perspectiva singular. Aos poucos vamos conhecendo a dinâmica das relações da família, as questões pessoais de cada elemento, sua forma de enfrentar a possível despedida. Somos convidados a refletir nossos lutos, nossas questões pessoais e familiares, nosso sistema de relações. Esther sofre de esclerose lateral amiotrófica, uma doença que irá acabar com ela em questão de pouco tempo: ela não terá mais os movimentos do corpo, perderá a consciência e no fim precisará de ajuda até para respirar. Com o consentimento de todos da família, eles farão uma despedida num fim de semana. Quando o momento chegar, tudo acontecerá sem que não fique claro tratar-se de escolha. Não será um final de semana fácil, definitivamente, não!
Acompanhamos a chegada da filha Heidi com o marido Michael, e o neto, a filha Sanne, com o namorado Dennis, além de uma grande amiga da família. Logo, somos informados sobre a saúde mental da filha mais nova, que parece ser bipolar ou sofrer de depressão. Diante da proximidade do acontecimento, ela se torna o foco de momentos tensos e emocionantes no filme. Seu namorado, sendo alguém de fora da família, faz um contra ponto interessante, evidenciado os fatos com o olhar objetivo de um estrangeiro em uma terra repleta de emoções. Os envolvidos vão sofrendo transformações ao longo da trama, quem parecia forte fica frágil e vice-versa. As diferenças e semelhanças surgem a cada instante, incluindo aquelas promovidas pelas diferentes gerações. Como já apontado em outros artigos, a Gestalt-terapia destaca diferença como campo fértil, lugar de encontro, contato, trocas transformadoras. Sendo assim, temos um exemplo claro na cena do neto, que explica para a avó o que é facebook, ela, por sua vez,  lhe ensina o como convidar uma menina pra sair. Há lugar para trocas afetivas de todos os modos, como ocorre entre a filha caçula e a mãe, no momento em que a Sanne entra em choque, transbordando desespero. A mãe, então, em resposta aos seus movimentos violentos, a abraça, convidando-a a estar no aqui e agora.  Não se trata de um melodrama, o filme chega a ser contido, apesar de tratar de um assunto sensível é bastante frio. O drama ainda consegue nos fazer rir, como na cena em que todos fumam maconha na sala com Dennis, momento no qual muitas coisas são esclarecidas. O tema é tenso, e, quando falamos de família, estamos falando de possibilidades e impossibilidades. Qualquer família tem conflitos de toda ordem, mas não há dúvida que existem episódios nos quais as diferenças perdem a força, e o “sangue “ fala mais alto. Assim acontece em momentos difíceis como na doença ou na perda de um ente querido. É comum que nestes momentos os membros esqueçam as diferenças e se lancem para a união familiar. Não é  fácil, mas as diferenças são esquecidas em função de um momento de dor partilhado.  Infinitamente mais difícil é também fazer parte da decisão de por fim à vida de alguém que amamos. Possibilidade de despedida é também luto antecipado, tornando complexo o processo. Esther afirma “Todos iremos morrer, a única diferença é que eu sei o dia exato”. O assunto ainda é tabu, morte e morrer são temas obscuros, mas é inevitável, se há uma certeza na vida é esta: nós todos iremos morrer. Como tratar do assunto sem excessos dramáticos, mas de forma natural? Enfrentar ou adiar? Adiar o enfrentamento ou adiar a morte? Até quando? Teremos muito o que pensar, independente das questões éticas e morais que envolvem a eutanásia, temos questões familiares, sociais, e, principalmente, emocionais.





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