sábado, 11 de julho de 2015

Gatos não têm vertigens

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ASSUNTO
Terceira idade, solidão, família disfuncional, adolescência, luto, relações afetivas, familiares e sociais.
SINOPSE
Rosa (Maria do Céu Guerra), uma professora reformada de 73 anos, recusa admitir que o seu marido (Nicolau Breyner) morreu e continua a vê-lo e a conversar com ele. Jó, que acabou de fazer 18 anos, foi expulso de casa. Os dois vão encontrar-se e iniciar uma improvável e terna história de amor. Um filme que fala sobre a solidão, do luto, da velhice e do encontro de duas pessoas de mundos tão diferentes. Jó vive com uma turminha que faz pequenos furtos, tem um pai alcoólatra e violento e sua mãe o abandonou. Ele está fazendo 18 anos e ninguém liga para ele. Rosa perdeu seu marido, seu grande companheiro e agora tem que enfrentar o genro que está de olho em seu apartamento para vendê-lo e sua filha que pensa que ela não pode mais viver sozinha, que precisa ir para um lar de idosos. É quando o destino vai unir estes dois e tudo pode ser diferente. Um belo filme.
TRAILER

O OLHAR DA PSICOLOGIA
Jó é um delinquente, proveniente de uma família disfuncional, abandonado pela mãe e sem suporte adequado do pai, que é alcoólatra. Rosa está em processo de luto, acaba de perder o marido e continua a dialogar com a imagem dele, que para ela permanece nos cômodos de sua casa. O jovem, ao fazer 18 anos, espera que alguém se lembre, lhe preparando algum tipo de surpresa ou dando-lhe algum presente. Rosa, na terceira idade, enfrenta o luto e a solidão. Como muitos em situações semelhantes, ela também precisa reafirmar sua autonomia, pois sua filha e genro programam vender seu apartamento e mandá-la para um lar de idosos. Se Jó se frustra com a pouca sensibilidade de seus pais no dia do seu aniversário, Rosa se decepciona ao perceber as intenções do genro em anular sua capacidade de decisão. O improvável encontro deles acaba por inaugurar um campo de suporte para o momento conturbado vivenciado por ambos. As diferenças permitem que ambos tenham a oportunidade de se deslocar daquele lugar, no qual estão neuroticamente aprisionados. Repleto de clichês, o filme não chega a ser uma obra prima, que aprofunde qualquer dos assuntos propostos. Entretanto, nos oferece, sim, boas oportunidades de reflexão.
É sabido que qualquer adolescente enfrenta um momento conturbado, no qual há um processo de identificação com o grupo. A construção de sua identidade, até o momento favorecida prioritariamente pela família, se desloca para o grupo. Esse processo ocorre com a maior parte dos adolescentes, que em sua maioria voltam-se contra a estrutura familiar, até então aceita como única fonte de valores e crenças. Entretanto, Jó não tinha qualquer estrutura afetiva. Sua família disfuncional o fazia duvidar do próprio valor. O grupo de amigos delinquentes lhe favoreciam um lugar no mundo, lugar de transgressão e possível identificação. Entretanto, sua sensibilidade não encontra espaço nesse universo, sobrando como lugar de expressão os seus cadernos, onde sua fragilidade e autenticidade tem espaço. Rosa, ao contrário, após longos anos de trocas afetivas perde seu companheiro de vida. Difícil momento, ela está fragilizada enfrentando a elaboração do luto, e, também um momento de afirmação da própria identidade. Quem é ela sem o marido, de que forma o meio a permite “ser” na ausência daquele que fez parte por muito tempo de sua vida? A Gestalt-terapia sinaliza a importância das diferenças para que o verdadeiro contato se realize, permitindo trocas, favorecendo o desenvolvimento dos envolvidos. O ponto de diferenciação é também de tensão, lugar de trocas, de descobertas, de aprendizado. Assim ocorre com Jó e Rosa, que em uma situação de crise, de tensão, constroem espaço para trocas de afetos, assim possibilitando outras formas de identificação. Se Rosa teve a oportunidade de perceber o adolescente, que através de seus escritos revelara sua sensibilidade, completando sua totalidade; Jô pode conviver com a senhora idosa que precisa socorrer e também com sua jovialidade, que revela transgressões permitidas por seus cabelos brancos. A relação se torna quase terapêutica, tendo em vista que tal encontro favorece ampliarem as próprias potencialidades. Nesse aspecto, são sutis os movimentos que favorecem o desdobramento de ambos num processo de mútua colaboração para autoafirmação de suas singularidades. Super recomendo, o filme é lindo!






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