sexta-feira, 5 de março de 2021

Loucura de amor/Louco por ella


ASSUNTO

Relações social, afetivas e de casal, saúde mental.

SINOPSE

Adri (Álvaro Cervantes) é o típico homem bem-sucedido na vida, garanhão, que não se prende a ninguém. Certa noite, ele faz uma aposta com os amigos de que consegue seduzir uma loira que está no bar, porém, quando estava a caminho da moça, Carla (Susana Abaiatua) esbarra nele. Encantado pela energia eufórica da moça à sua frente, Adri se sente hipnotizado e segue aquela enigmática moça em todos os seus mirabolantes planos – e, com ela, tem a melhor noite de sua vida. Porém, com o nascer do sol, a misteriosa moça sai correndo, deixando Adri sem nenhuma informação sobre ela e com um enorme vazio no peito.

TRAILER



O OLHAR DA PSICOLOGIA

Que grata surpresa! Há muito tempo que não assistíamos a um filme assim, leve, encantador e interessante. Sim, interessante, pois a comédia romântica escolheu pincelar assuntos sérios e necessários, de forma leve e provocante. Obviamente, loucura e amor são assuntos já debatidos em diferentes contextos, pois sempre foram considerados parentes. No filme, a loucura não se restringe ao estado da paixão enlouquecedora, mas vai além, ao percorrer o caminho delicado da saúde mental. Sim, estamos diante de Adri, personagem que se considera normal, e, após compartilhar a aventura de uma noite inesquecível, se percebe capturado pela garota misteriosa. Carla, personagem que lhe proporcionou a noite mais alucinante, prazerosa e inusitada de sua vida, avisou que seria uma única noite, mas não bastava, ele queria mais. Entorpecido, busca pistas para encontrar a mocinha. Até então, é inevitável pensar na cinderela e o sapatinho dos contos de fadas... 

Na jaqueta, esquecida pela moça, havia sinais que apontavam um caminho.  Ainda na ilusão de ser o príncipe salvador, Adri encontra e traça planos para salvar a mocinha, que estaria “presa” em uma instituição psiquiátrica. Só que não, a mocinha não queria ser salva! O que ele não sabia era que ela não estava trancafiada contra a vontade, nem tão pouco era princesa. Carla era uma paciente com transtorno bipolar, que nos episódios de mania, conseguia sair e se arriscar em aventuras extasiantes. Sem perder o charme das comédias românticas, e, apesar das linhas pouco críveis que costuram a trama, a forma que a saúde mental emerge foge aos estereótipos, revelando personagens reais, humanos e portadores de diferentes transtornos mentais.  Pensar “fora da caixinha” é difícil para Adri e pode ser também para o público, que é surpreendido pela forma em que saúde mental é retratada. O protagonista pode ser avaliado como pretensioso, daquele tipo que consegue tudo que quer, sendo conquistado pela ruptura abrupta de algo intenso e apaixonante que acredita ter vivido. Ele acredita que o amor será suficiente para fazê-la acreditar na própria cura, revelando a ‘normalidade’ da moça. Entre o “normal” e o “patológico”, público e personagens caminham, desconstruindo a visão distorcida sobre saúde mental, num convite implícito para “sair da caixinha”, aquela repleta de verdades equivocadas. A entrada de Adri afeta o sistema, tanto quanto ele é também afetado, resultando em transformações mútuas durante a experiência. Esquizofrenia, bipolaridade, Transtorno Obsessivo Compulsivo e Síndrome de Tourette são transtornos que podem ser identificados na trama. Saul, personagem que divide o quarto com Adri, é coadjuvante, mas carrega a humanidade necessária para comover e provocar o público. Ele é responsável por levantar questões sobre a dita “normalidade”. Além de revelar no encontro o quanto o desejo de melhorar não é suficiente, nos casos de transtornos mentais graves. A portadora de síndrome de Tourette  (doença neurológica que leva a pessoa a realizar atos impulsivos, frequentes e repetidos, também conhecidos como tiques, como piscar os olhos ou movimentar as mãos e os braços, que depois se agravam, surgindo palavras repetidas, movimentos bruscos e sons como latir, grunhir, gritar ou falar palavrões, por exemplo) emociona, ela revela sua dificuldade de auto estima, que prejudica o desenrolar de sua relação afetiva. Vamos combinar, não deixam de ser dificuldades comumente encontrada em alguma fase da vida de qualquer um. Aliás, qual é o limite de cada um? O filme provoca questões sobre os limites necessários em qualquer relação afetiva. O protagonista, por exemplo, exibe um “saber” equivocado sobre o tema, acreditando que frases positivas, ou, premissas, facilmente encontradas em livros de autoajuda, serão suficientes para transformar ou curar. A convivência dele com os pacientes revela sua incapacidade de respeitar o outro como ele é, o que, definitivamente, não se restringe as relações com pacientes. Amar, gostar, desejar não pode ser sinônimo de transformar o outro naquilo que convencionamos como adequado, todo ser tem sua singularidade que precisa ser respeitada. Diante do momento delicado do  nosso país, considerando os retrocessos no trato com saúde mental, o filme traz um olhar humanizado  muito bem-vindo. Apesar de descrever uma instituição que está longe da realidade brasileira, e, em alguns momentos “escorregar” no viés cômico, a personagem médica também dá seu recado. Ela destaca a  insuficiência, ou, até o risco no tipo de apoio que leigos podem oferecer, mesmo sendo carregado de afeto, Outro aspecto que pode ser estendido para qualquer tipo de relação afetiva. Saber quando procurar ajuda profissional, se informar sobre como ajudar, vai além dos transtornos graves, pode ser simplesmente por acreditar em soluções próprias para a necessidade do outro, sem que haja conhecimento real sobre o que acontece. De fato, o filme pode ser mais do que um entretenimento, um colírio em momentos de isolamento, um afago na alma, confira!

 


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