domingo, 15 de junho de 2014

Disconnect

 
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ASSUNTO

Relações familiares, afetivas, sociais e virtuais. Luto, relação terapêutica, abordagem gestáltica, fobia social, adolescência, crimes virtuais, cyberbullying, casal e família.

SINOPSE

Este drama mostra várias histórias pessoais, tendo em comum os efeitos perversos do uso excessivo de tecnologia, Internet e telefones celulares. A vida de um casal entra em perigo quando sua vida privada é exposta online, uma viúva e antiga policial descobre que seu filho humilha um garoto da escola pela Internet, um advogado obcecado por seu telefone não consegue se comunicar com a própria família, e uma jornalista vê sua vida se transformar quando ela pesquisa a história de um adolescente que faz atuações eróticas pela webcam.

TRAILER



O OLHAR DA PSICOLOGIA

Não é o primeiro filme que discute o tema. “Rede Social” explorou as dificuldades de relacionamento do autor do facebook. Recentemente, “Ela” entrou no Universo afetivo entre o real e o virtual, revelando angústias e carências contemporâneas. Em “Disconnect”, a trama retrata alguns dos principais riscos das relações que estão sendo construídas nas redes sociais, a partir de três histórias que vão se conectando ao longo do filme. Baseado em fatos reais, o enredo costura a trama partindo de vidas que irão se conectar na rede virtual ou real através de alguns acontecimentos. Diante desta teia virtual, a trama nos apresenta diferentes formas de conexões e desconexões nas relações contemporâneas. Em cada um dos três casos, temos contatos pouco saudáveis, virtuais ou reais sendo pontuados, que podem ou não se desenvolver para um melhor contato ou uma solução saudável. Desta forma, temos bastante para refletir sobre diferentes formas de fazer contato com o outro, seja através do virtual ou não. Em tempos de globalização, as relações virtuais ganham formas humanas, no entanto, por outro lado promovem novos tipos de conflitos e distúrbios emocionais.
Os sites e chats pornôs são alvo da investigação da jornalista Nina, por razão de recrutarem menores de idade para o trabalho. A ambiciosa repórter consegue uma entrevista exclusiva com um dos rapazes, com quem constrói um vínculo pessoal. Nessa parte da trama, somos convidados a refletir sobre as diferentes formas de ver e/ou funcionar no mundo. É sabido que nem sempre a compreensão do Universo do outro é possível, principalmente quando o sujeito se fecha em um mundo de certezas, repleto de “deveres” e de julgamentos. Ao tentar se colocar no lugar do entrevistado a partir de sua perspectiva pessoal, a jornalista se esquece da principal pergunta: Como é para Kyle a percepção de sua forma de funcionar no mundo? Diante deste universo desconhecido, Nina quer ajudar ao adolescente, mas o faz a partir daquilo que conhece como “melhor”. Ela não o consulta sobre como ele se percebe ou o que ele considera “melhor”, e, Nina também não se envolve o suficiente para favorecer ao adolescente a descoberta de outra forma de vida. Aqui, vale refletir sobre a relação terapêutica, pois o terapeuta que pretende “ajudar” ao cliente perde a oportunidade de realizar bom trabalho. Como Fritz Perls afirmava, Quando tento ajudar, tenho uma ideia de ajudar. Começo com um conceito, tenho uma opinião, uma convição... Para Perls, “ajudar” ou “ensinar” algo ao cliente não é o trabalho do terapeuta, pois só o cliente sabe o que é melhor para si. Em Gestalt-terapia explicada, ele diz: Nossa visão de terapeuta é que ele é semelhante àquilo que o químico chama de catalisador, um ingrediente que precipita uma reação, que de outra maneira poderia não ocorrer. (... ) O que ele faz é simplesmente dar inicio a um processo, e há alguns processos que, uma vez iniciados, são automantenedores e autocatalíticos. (...) Admitimos ser este o caso da terapia. (... ) O caso bem sucedido não é uma cura no sentido de um produto acabado, mas uma pessoa que sabe que possui ferramentas e equipamentos para lidar com os problemas à medida que estes surjam. Sendo assim, o processo terapêutico visa favorecer que o cliente descubra seu próprio potencial, ampliando sua visão de mundo a partir do lugar em que se encontra no momento presente. Favorecer ao cliente outras perspectivas, outras formas de ver o mundo, sim, entretanto a escolha de qual caminho seguir é responsabilidade do cliente!
Retomando ao emaranhado da trama, vamos encontrar a ligação da jornalista com o advogado Rich Boyd, na ocasião em que sua reportagem chama a atenção do FBI, que a pressiona em busca da fonte de sua matéria. O advogado da rede televisiva é acionado, mas encontra-se ocupado com os problemas de seu filho adolescente, o solitário Ben. Chamo a atenção para a cena do jantar familiar, que retrata o que está se tornando comum nas famílias contemporâneas: Todos desconectados entre si, mas conectados com a REDE VIRTUAL em seus respectivos telefones. Como bem sinalizado por Raphael Moroz, a cena traz uma crítica não só contra essa virtualização que estamos vivendo, como também à incoerência dos pais em relação à educação dos filhos (para ler a crítica completa, clique aqui.).
Voltando ao Ben, como tantos outros, o rapaz vive no isolamento social, não consegue encontrar seu lugar no ambiente que o cerca. Entretanto, no universo virtual há espaço para o exercício de se relacionar, o que o torna alvo fácil para o cyberbullying. Abro parênteses aqui, para fazer alguns comentários sobre o que chega com frequência no set terapêutico. Trata-se de adolescentes de baixa autoestima, que em algum momento perderam a oportunidade de ser confirmados em sua identidade. De alguma forma, eles aceitaram a informação de desaprovação do seu jeito de ser (introjeção), compreendendo o meio ambiente como uma massa da qual não consegue se adaptar. A ilusão de que os outros são todos “iguais”, porém diferentes de si, com comportamentos “normais” adaptados à realidade que os circundam, faz com que se percebam como alvo de críticas e desaprovação. Esses adolescentes podem pensar que as pessoas a sua volta estão desaprovando suas atitudes e comportamentos, quando ele mesmo é que não aprova a própria singularidade. Podem também encontrar em sua forma “especial” de ser, motivo suficiente para não se misturarem com os outros, que se mostram como incompreensíveis ou inferiores. Mas isso não faz com que o que há de comum, de fato, entre os seres humanos não ocorra com ele. Ele deseja amar e ser feliz como qualquer um e pode sofrer com o que considera que a sociedade espera deles, não conseguindo se “encaixar” no meio social. Na sua escola, outros adolescentes estão em momento de afirmação e confusão, eles vivem no intervalo entre a criança que foram e o adulto que se tornarão, não sabem o que são. Assim, eles buscam a afirmação da própria identidade no grupo social, muitas vezes cometendo atos cruéis, sem que se deem conta disso. É o caso dos colegas da escola de Ben, que decidem começar uma brincadeira que irá resultar num caso de ciberbullying com consequências graves. Um dos meninos é filho do investigador de crimes virtuais Mike, contratado para atender o casal Hull. Cindy e Derk Hull estão em momento de luto pela perda de um filho pequeno. Diante do fato, ambos se afastam e não conseguem dialogar. Enquanto ele entra em sites de jogos e mergulha no trabalho evitando o assunto, ela procura ajuda num grupo virtual de apoio, até ambos descobrirem que foram vítimas de uma fraude virtual, o que os deixou absolutamente sem dinheiro. Aqui, temos o luto doloroso da perda de um filho como foco, o que pode trazer problemas sérios para os que sobreviveram. O distanciamento ou qualquer outro comportamento que torne a família disfuncional é comum em casos semelhantes. No filme, o pai não consegue tocar no assunto, o que faz com que ambos se distanciem, sendo alvo fácil para o crime virtual. Importante salientar que o luto, um processo difícil em qualquer situação, pode se tornar insuportável e/ou devastador, o que faz com que a ajuda de uma religião, um amigo ou um profissional de saúde seja imprencindível.
Se existe um conceito que é caro na Abordagem Gestáltica, ele se chama CONTATO, lugar onde o ser humano se encontra ou se revela a partir do outro, a partir do encontro com do meio circundante. A mais curiosa das críticas feitas às chamadas “redes sociais”, é aquela que sinaliza seu paradoxo, pois contrinbuem com o oposto de sua proposta, que seria a conexão. Recentemente, uma propaganda de telefone celular usou o slogan “desconecte para conectar”, sinalizando a importância do contato pessoal em detrimento de tantos contatos virtuais. Disconnect segue a mesma linha ao denunciar alguns riscos evidenciados no universo virtual. Mas, não podemos esquecer, que o mundo virtual pode nos trazer diversos avanços na comunicação, no estudo, na ciência, e,  também no contato. Basta pensarmos em “boas formas” de fazermos uso da rede, que está disponível cada vez mais e para maior número de pessoas em todo o mundo.









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