ASSUNTO
Relações afetivas, conflitos existenciais, amor.
SINOPSE
Baseado no conto da Bela Adormecida, o filme conta a história de Malévola (Angelina Jolie), a protetora do reino dos Moors. Desde pequena, esta garota com chifres e asas mantém a paz entre dois reinos diferentes, até se apaixonar pelo garoto Stefan (Sharlto Copley). Os dois iniciam um romance, mas Stefan tem a ambição de se tornar líder do reino vizinho, e abandona Malévola para conquistar seus planos. A garota torna-se uma mulher vingativa e amarga, que decide amaldiçoar a filha recém-nascida de Stefan, Aurora (Elle Fanning). Aos poucos, no entanto, Malévola começa a desenvolver sentimentos de amizade em relação à jovem e pura Aurora.
TRAILER
O OLHAR DA PSICOLOGIA
A mais encantadora das criaturas se chama Malévola, uma fada-menina linda que tem chifres, asas e mora no reino encantado de Moors, repleto de criaturas mágicas, encantadoras, estranhas e diferentes do que os humanos podem considerar belo. A harmonia com a natureza é marca deste lugar que não tem rei. Há entre os habitantes respeito mútuo, o que garante a harmonia. Muito próximo há outro reino, que habitado por humanos, tem um rei e está repleto de sentimentos “demasiadamente humanos”, como ganância, disputa pelo poder, inveja, intolerância, etc. Malévola, por ser a mais poderosa das fadas, assume o lugar de protetora de seu reino, pois a harmonia com a natureza e a boa convivência com as diferenças se tornam alvo de incompreensão e inveja do reino vizinho. Assim começa a história daquela que se transformou em uma das vilãs mais conhecidas dos contos de fadas. A grande diferença está em apresentar um novo ângulo.
Deparei-me com uma frase curiosa na crítica de Bruno Carmelo, que diz: Esta é mesmo uma versão moderna da história, como anunciaram os produtores, mas a forma está mais modernizada do que o conteúdo. Para quem conhece a abordagem gestáltica, a frase seria considerada atraente, o que não deve ter sido a intenção do crítico. De fato, gestalt é uma palavra alemã que não tem tradução, mas o que se aproxima mais desse conceito é a palavra FORMA. Forma ou boa forma é o que todos buscamos, independente do conteúdo. Para gestaltistas, se a forma é bela, harmoniosa e tem movimento fluído, o ser humano está em equilíbrio saudável. O psicoterapeuta observa mais a forma do que o conteúdo. Por exemplo, é mais importante observar a forma com que o cliente diz, do que o que é dito pelo cliente. Iluminar ou apontar a forma incongruente, fraca ou aquela que contradiz o que é falado é considerado como relevante no processo terapêutico. Portanto, discordo quando o crítico considera pouco a realização da mudança na forma e não no conteúdo. Aliás, é exatamente pela forma que a mudança pode ser percebida. Falamos da história da Bela adormecida, que apesar de manter alguns pontos conhecidos, é diferente em sua forma, aqui iremos conhecer o ponto de vista de Malévola.
Aqui, temos uma menina-fada que é capaz de fazer amizade e se encantar com o jovem humano que tenta roubar as riquezas de seu reino. Durante seu desenvolvimento, ela perde parte de sua doçura, ao vivenciar grande traição e desilusão amorosa com esse mesmo jovem por quem se apaixonou. Ela, então, passa a desacreditar no amor verdadeiro, e, se vinga através de uma maldição direcionada à futura herdeira do traidor. Os outros personagens são quase ignorados ou pouco aprofundados, pois a nova versão dá destaque aos conflitos vivenciados pela menina-fada durante seu desenvolvimento, o que a aproxima do que há de mais humano e verdadeiro no sexo feminino: a complexidade. O que acaba deixando os outros personagens empobrecidos, sem expressão, com a exceção do corvo, que em alguns momentos parece se tornar a voz da consciência de Malévola. Somos convidados a refletir e questionar sobre algumas possibilidades no enfrentamento das desilusões e frustrações e outras coisas mais. Atos impensados ocorrem quando a mágoa comanda o espetáculo, o que pode causar consequências indesejáveis. É o caso de Malévola, que se arrepende de seu ato cruel no momento da vingança. Como bem apontado por Eleonora: Aqui aparece a grande mudança que faz a história de Malévola ser mais contemporânea. Saímos da maldade da bruxa egoísta e entramos em contato com uma mulher forte e protetora dos mais frágeis, mas com emoções ambíguas, que habitam seu coração ferido por seu amor recusado e traído. (para ler a crítica completa clclique aqui.). Ela lança sua maldição na filha de quem a decepcionou, estando sua anulação condicionada ao que para ela não pode ser mudado, devido a sua descrença no amor verdadeiro. Entretanto, sua ação faz com que o pai tente isolar a filha na intenção de protegê-la, o que faz com que os papéis sejam invertidos.
Durante o desenvolvimento da menina, quem mais está próxima, protege e cuida dela é a própria Malévola, que desenvolve um doce vínculo com a menia. Suas crenças são colocadas em choque no momento em que deseja desfazer o feitiço. Não há mais como voltar atrás, o feitiço só poderia ser quebrado por aquilo que ela não acreditava mais: o verdadeiro amor. O feitiço vira contra a feiticeira, pois ela mesma é quem sofre com a possibilidade de perder para sempre Aurora, a menina doce que foi, por 16 anos, acompanhada e protegida por ela. Importante destacar que do início até o seu final, Malévola somente reage, nunca age por livre e espontânea vontade de fazer o mal. O desfecho é surpreendente e vai tornar a experiência da garotada bastante interessante. Gostei desta perspectiva mais moderna e atualizada, afinal, essa coisa de pessoas perfeitas e príncipes que conquistam a partir de um único beijo, já está fora de moda.
Fora isso, podemos pensar na grande sacada da nova versão, ao apresentar personagens que expressam bem as rupturas, divisões ou dicotomias que ameaçam o equilíbrio do ser. Reparem na possível representação de feminino e masculino - divisão dos reinos, boa e má - própria Malévola, bem e mal - e outros mais. Ainda é possível destacar um aspecto, que se refere ao conflito existencial entre o que consideramos dentro (a pessoa) e o fora (o ambiente). A abordagem gestáltica considera o organismo integrado, não tem tem a visão de homem/mundo dissociada, pois um faz parte do outro. Neste sentido a trama trabalha em direção semelhante ao processo terapêutico, que visa a integração dos polos, das polaridades bom e mau, bem e mal, certo e errado, feio e bonito, feminino e masculino ou dentro e fora. A integração é o objetivo, sempre!
Adorei!
ResponderExcluirObrigada, Chistiana Chagas. Vale a pena tentar sempre...bjokas
ExcluirPatricia, muito bom esse texto. Mas você também não acha que a Malévola é a personificação das mulheres de hoje em dia? Mulheres fortes e bem sucedidas, que crescem lutando e protegendo seus ideais (reinos), que têm voz forte... Mas diante do amor, viram mulheres frágeis e submissas, loucas para dividirem suas vidas e sonhos. Em contraponto, os homens são como o menino - ambiciosos e racionais ao extremo. Que usam as mulheres apenas para conseguir o que querem e alimentar seu ego. Pra mim, essa versão é uma releitura dos tempos atuais, já que, como você mesma fala no texto: "perspectiva mais moderna e atualizada, afinal, essa coisa de pessoas perfeitas e príncipes que conquistam a partir de um único beijo, já está fora de moda."
ResponderExcluirAbraço
Tati,
ExcluirAcho importante sua percepção, uma perspectiva interessante. Como outros filmes aqui postados, as diferentes percepções é que podem enriquecer nosso universo pessoal. Portanto, muito obrigada por sua participação. Volte sempre!
Abs,